Meu afeto pelos filmes e Alan Parker

Eu sempre gostei de filmes. Menina, costumava assistir a qualquer um que passasse na tevê, mas não os de terror. Esses sempre me deixavam meio agoniada, então os evitava. Eu os evito até hoje, apesar de abrir exceções para certos atrevimentos.

Não era apenas entretenimento. Eu queria mais daqueles filmes. Eu queria entender como eles funcionavam. Minha curiosidade se apegava aos detalhes: de onde veio a ideia para aquele determinado diálogo? Por que a câmera olha para os atores daquele jeito? Qual o motivo para aquela coreografia de gestos dos atores? Que cores são aquelas? De onde ele tirou aquele olhar? De onde veio o suspiro dela? E aquelas lágrimas? Aqueles sorrisos? Aquela violência? Aquela sala apinhada de sabe-se lá o quê? Aquele silêncio prefaciando um grito?

Há duas coisas que eu estudaria, se a minha vida já não se atrapalhasse durante as 24 horas do dia: cinema e violoncelo.

Apesar de achar muito interessante alguns filmes em que o foco são os efeitos especiais, o que realmente me pega é o olhar mais íntimo: uma boa história, fotografia que se desenvolve – e se envolve bem – com o texto, diálogos bem construídos, direção competente, atuações inspiradas, trilha sonora que se mistura lindamente a tudo isso.

Assisti a um programa sobre um dos diretores que mais admiro: Alan Parker. O bom do especial era que o próprio diretor contava sua trajetória, abordava curiosidades do "por trás das câmeras" e citava complicações, histórias que são sempre muito bem-vindas e podem atuar perfeitamente como aprendizado.

Alan Parker

Não descarto um filme de Alan Parker. Cada um deles tem a sua peculiaridade e a sua riqueza. De O Expresso da Meia-Noite (Midnight Express/1978), passando pela aula que é assistir Mickey Rourke e Robert De Niro contracenando em Coração Satânico (Angel Heart/1987) e  Gene Hackman e Willem Dafoe em Mississipi em Chamas (Mississipi Burning/1988), chegando à complexidade de As Cinzas de Ângela (Angela’s Ashes/1999) e A Vida de David Gale (The Life of David Gale/2003).

Coração Satânico/Angel Hart | Robert de Niro e Mickey Rourke

É impossível pensar em Alan Parker e não se voltar à conexão que mantinha com a música: Fama (Fame/1980), Pink Floyd – The Wall (1982), The Commitments – Loucos Pela Fama (The Commitments/1991) e Evita (1996).


Pink Floyd - The Wall

Gosto de pensar em filmes como um calendário da minha própria história. Alan Parker é um dos diretores que fez parte da minha predileção por filmes considerados mais simples tecnologicamente, mas requintados na sua construção. Às vezes, a simplicidade é complexa e conta com muitas camadas.

The Commitments

Enfim, eu sempre gostei de filmes, e os de Alan Parker fisgaram a minha curiosidade. Sempre aprendi com os filmes, e muito desse aprendizado acaba nos livros que escrevo. Uma das minhas alegrias foi quando Eduardo Loureiro Jr., ao escrever o prefácio do meu romance, Jardim de Agnes, disse: “Este livro não merecia um prefácio, mas um trailer. Este livro não é feito de capítulos, mas de cenas. Você tem vontade de ler de uma só vez. E, quando acaba, você aperta os olhos e tenta se acostumar com a luz acesa da realidade.”

Não sou escritora apegada à descrição de ambientes e características físicas. Meu foco está sempre no personagem e seus enfrentamentos. Ainda assim, é muito comum alguém dizer que, ao ler minhas histórias, sente-se como se assistisse a um filme. Essa ideia pode até não forjar uma roteirista de cinema em mim – acreditem, eu tentei e continuo a me encantar no atrevimento –, mas mostra o quanto o cinema é importante para a minha escrita.

O mais próximo que cheguei da linguagem do cinema, foi quando um conto do meu livro O observador foi adaptado para um curta. Na verdade, o conto está lá, sendo narrado, e o francês Émilien Berenfeld é responsável pelo filme. Fiquei muito feliz com esse projeto, que acabou reunindo pessoas muito interessantes, incluindo alguns queridos amigos. O conto Lembretes ganhou uma versão em inglês, Reminders, e o filme conta com legendas em português e francês. Segue no final, para quem quiser assisti-lo.

Documentários são importantes. Ultimamente, tenho assistido a muitos e de todas as áreas. Conhecer mais a respeito daqueles que influenciam o nosso mundo, saber que muito do que temos e fazemos hoje se deve à visão que eles tiveram, não é apenas reconhecimento do mérito dessas pessoas na História, mas também enriquecimento da nossa própria linguagem. É aprendizado e, como todo aprendizado que visa a construção, vale a pena.

Então, vamos a ele... ao (meu) aprendizado.


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